Os avanços dos estudos sobre o cérebro humano ajudaram a humanidade a entender como nos relacionamos, sentimos, agimos. E aprendemos.
A neurociência revolucionou o processo de ensino e aprendizagem e ofereceu subsídios para educadores planejarem aulas mais inclusivas, que levam em consideração as especificidades de cada um dos estudantes.
Hoje todo professor precisa conhecer preceitos básicos de neurociência e aprendizagem se quiser acompanhar a transformação na educação que está em curso. Para você não ficar para trás, preparamos este artigo introdutório sobre a relação entre as áreas. Você vai ver:
A neurociência é o campo científico que investiga o sistema nervoso, formado pelo cérebro, medula espinhal e nervos periféricos, e as ligações dele com toda a fisiologia do corpo humano.
Como campo autônomo, ela existe desde a década de 1970. A neurociência é uma área interdisciplinar, reunindo saberes da biologia, medicina, química, matemática, linguística, psicologia, engenharia, física e ciência da computação.
Todas estas disciplinas ajudam a compreender como mais de 86 bilhões de células nervosas nascem, se desenvolvem e se conectam. Assim, cientistas conseguem decifrar os comandos e as funções do cérebro, além das alterações que o órgão sofre no processo de envelhecimento humano.
Os principais temas estudados na neurociência são:
Avanços significativos na área de transtornos de saúde mental e doenças do sistema de nervoso relacionadas ao envelhecimento fizeram com que a década de 1990 ficasse conhecida como “A Década do Cérebro”.
Hoje a neurociência é dividida em ramos de especialização, que são:
Reparou no último ponto? Sim, a pedagogia já ganhou um ramo da neurociência para chamar de seu.
A neurociência ajuda a entender como o ser humano desenvolve capacidades de linguagem, criatividade e raciocínio, por meio do monitoramento da atividade cerebral de crianças e adolescentes ao realizarem tarefas cognitivas. Para isso, recorre-se a tecnologias como a ressonância magnética, a tomografia e o eletroencefalograma.
Estudos com essas tecnologias corroboraram a noção de que a aprendizagem está intimamente ligada ao desenvolvido do cérebro. Este é moldável aos estímulos do ambiente, que levam os neurônios a formarem novas sinapses.
Explicando de forma esquemática, os neurônios são as células que formam o cérebro. Eles são capazes de fazer sinapses, que são os canais de comunicação entre dois ou mais neurônios. A comunicação se dá por meio de sinais elétricos, que formam circuitos de processamento de informação.
Os estímulos ambientais fortalecem os circuitos, que se multiplicam e formam conexões cada vez mais rápidas. Eles acabam por formar uma rede, ligando diferentes regiões do cérebro.
Assim, da perspectiva da neurociência, a aprendizagem é um processo desencadeado pelo cérebro ao reagir aos estímulos do ambiente. As sinapses geradas formam circuitos que processam as informações e com capacidade de armazenamento molecular. Todo o cérebro é ativado no processo de aprendizagem, do nível molecular e celular às áreas corticais. É também a partir da observação do comportamento cerebral que é possível identificar transtornos de aprendizagem.
O debate no meio científico de unir neurociência e aprendizagem remonta à década de 1960, mas ganhou um novo fôlego com as novas descobertas na área, particularmente na neurociência cognitiva. Este subcampo estuda a ligação entre cérebro, atividades mentais superiores e comportamento, recorrendo à psicologia.
Quando aliada à psicologia, a relação entre neurociência e aprendizagem se torna ainda mais efetiva. A neurociência se concentra no estudo das alterações do cérebro durante seu funcionamento, enquanto a psicologia foca nos significados, ou seja, em como as crianças percebem, interpretam e utilizam o conhecimento adquirido.
O curioso é que a relação entre neurociência e aprendizagem veio a confirmar as principais ideias de teóricos da educação como Jean Piaget (1896-1980), Lev Vygotsky (1896- 1934), Henri Wallon (1879-1962) e David Ausubel (1918-2008). Entre elas está o impacto das emoções na retenção de informação, a importância da motivação e da atenção para estudar e a capacidade do cérebro de se modificar de acordo com experiências e o contato com o meio.
Para o processo de aprendizagem ser bem sucedido, o cérebro de um indivíduo precisa desenvolver três grandes funções:
O fascínio pelas últimas descobertas sobre a capacidade do cérebro humano levou a interpretações erradas sobre a relação entre neurociência e aprendizagem. O fenômeno até recebeu um nome-próprio em 2002 pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), "neuromitos". Os mais difundidos são:
Este mito foi quebrado com os exames de neuroimagem, que mostram a ativação das regiões do cérebro. Neurocientistas buscaram a origem da afirmação, alertando que não foram encontradas evidências científicas de que exista alguma parte do cérebro humano que nunca fora utilizada.
Artigos científicos que desmistificam este neuromito:
A origem deste mito está nos estudos de especialização hemisférica do cérebro, que relacionaram o lado esquerdo à linguagem e o direito ao pensamento abstrato. Apesar de boa parte do processamento da linguagem acontecer no hemisfério esquerdo, isso não significa que o lado direito não realize funções relacionadas à linguagem, e vice-versa.
Artigos científicos que desmistificam este neuromito:
A noção de múltiplas inteligências já está ultrapassada e acaba por ofuscar as últimas descobertas da neurociência sobre a aprendizagem. Ela defende que uma pessoa tem múltiplas habilidades: linguística, lógica, espacial, cinestésica, interpessoal, intrapessoal, naturalística e musical.
O problema é que este modelo geralmente é interpretado pelo público leigo como se não houvesse correlação entre as diferentes habilidades dos sujeitos.
Artigos científicos que desmistificam este neuromito:
Ainda faltam evidências da neurociência que comprovem os modelos de aprendizagem multissensoriais, como os que trabalham com estimulação visual, auditiva e cinestésica. Eles trabalham com o pressuposto de que as informações obtidas por meio de uma modalidade sensorial são processadas no cérebro sem se relacionar com o conteúdo aprendido a partir de outra modalidade.
Artigos científicos que desmistificam este neuromito:
Não existem evidências concretas que associem diretamente o consumo de água com uma melhor aprendizagem.
Artigos científicos que desmistificam este neuromito:
Os transtornos de aprendizagem são definidos como distúrbios de neurodesenvolvimento. As condições neurológicas aparecem cedo na infância, antes mesmo da criança ir para a escola. Geralmente, elas prejudicam a aquisição, manutenção e aplicação de habilidades ou informações específicas.
Os transtornos de aprendizagem podem afetar as capacidades de atenção, memória, percepção, linguagem, solução de problemas ou interação social. Na prática, o estudante que apresenta algum distúrbio de neurodesenvolvimento dá estes sinais em sala de aula:
🔵Leia também: Os 6 principais transtornos de neurodesenvolvimento em crianças para ficar alerta
Não existe uma causa única para uma criança apresentar um transtorno de aprendizagem, contudo, questões genéticas geralmente estão envolvidas. Exposição a toxinas ambientais, desnutrição severa, traumas e privação social grave podem desencadear a condição.
Os transtornos de aprendizagem mais comuns são:
A dislexia é um termo geral que engloba distúrbios de leitura, matemática, ortografia, expressões escritas ou manuscritas, compreensão ou uso da linguagem verbal ou não verbal. De acordo com a Associação Brasileira de Dislexia, cerca de 17% da população mundial apresenta este transtorno de aprendizagem.
As últimas descobertas da neurociência sobre aprendizagem relacionam anormalidades congênitas do desenvolvimento neural à dislexia. Ela está relacionada a disfunções de áreas cerebrais responsáveis pela linguagem, fala e interconexão entre ambas.
A dislexia fonológica é caracterizada pela incapacidade de decodificação de sons, manifestando-se por meio de um desempenho ruim na leitura de estímulos não familiares e na invenção de palavras.
Crianças com este transtorno de aprendizagem apresentam dificuldades em tarefas de memória de curto prazo, enquanto na leitura se baseiam no reconhecimento da palavra inteira, por terem dificuldade em relacionar os grafemas aos fonemas.
Neste tipo de dislexia, as pessoas têm dificuldade em reconhecer as formas e estruturas das palavras, ou seja, de reconhecer a palavra pela rota lexical.
Em sala de aula, estudantes com dislexia superficial geral substituem, adicionam ou omitem as letras de palavras. Acabam tendo uma maior dificuldade com ortografia e guiam-se principalmente pela informação auditiva.
Esse transtorno de aprendizagem traz prejuízos na expressão escrita, devido à alteração funcional do componente motor do ato de escrever. Ou seja, alguém com disgrafia tem problemas de caligrafia, no traçado e na forma das letras. É importante ressaltar que o estudante que apresenta a disgrafia tem um desenvolvimento intelectual normal.
A disgrafia se manifesta em habilidades de escrita aquém do esperado para a faixa etária. Geralmente, a criança não consegue escrever na velocidade exigida e tem dificuldades em alinhar, espaçar e dimensionar letras e palavras.
Lembrando que a escrita caligráfica envolve habilidades percepto-motoras e cognitivas, o que acaba por impactar o desempenho acadêmico e psicossocial do indivíduo.
A discalculia compromete principalmente o aprendizado de matemática. Ela se manifesta na dificuldade em solucionar questões, estimar quantidades, memorizar números e reconhecer padrões. Geralmente, quem tem esse transtorno de aprendizagem também tem dislexia.
Transtorno de aprendizagem caracterizado pela dificuldade em formar conceitos básicos e adquirir aptidões de computação.
A afasia anômica manifesta-se na dificuldade em recordar palavras e recuperar informações da memória. Quem tem este transtorno de aprendizagem geralmente tem uma linguagem expressiva fluente, porém não consegue evocar palavras específicas. Ela acaba por recorrer a circunlóquios e palavras gerais para se comunicar, tanto na fala quanto na escrita.
Após esta breve introdução à relação entre neurociência e aprendizagem, pode parecer que este campo científico é uma panaceia para todos os problemas educacionais. Aqui fica um alerta: a neurociência é uma grande aliada para compreender e diagnosticar problemas, no entanto, ela não oferece uma fórmula pronta para um plano pedagógico incrível ou métodos de ensino infalíveis.
É preciso lembrar que a neurociência permite a compreensão de forma abrangente do desenvolvimento da criança, o que envolve a integração entre o corpo e o meio social. Não apenas o cérebro, mas os contextos social, político, cultural e econômico do estudante precisam ser considerados para oferecer um ensino de qualidade.
O professor deve unir a experiência em sala de aula com o conhecimento, mantendo-se sempre atualizado sobre os últimos estudos da pedagogia, neurociência e aprendizagem. Uma especialização é o primeiro passo para conseguir de maneira confiável as informações necessárias para transformar a educação.
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